Exclusão de óleos vegetais da cesta básica gera reação no agronegócio
Representantes do setor de óleos comestíveis tentam reverter decisão que exclui quase todos os óleos vegetais da alíquota zero da Reforma Tributária.
A exclusão de quase todos os óleos vegetais comestíveis da lista de benefícios fiscais da nova Reforma Tributária tem gerado forte reação entre representantes do setor agrícola e da indústria alimentícia. A decisão recente da Câmara dos Deputados restringe a alíquota zero de tributação a apenas três produtos: soja, milho e babaçu, retirando da cesta básica óleos como algodão, canola, girassol, coco, palma, amendoim, linhaça e outros.
Para Hiltom Lima, presidente do Sindicato da Indústria da Extração de Óleos Vegetais e Animais e de Produtos de Cacau e Balas da Bahia (SIncaol), a exclusão limita drasticamente a variedade de produtos à disposição do consumidor e afeta a competitividade de óleos comestíveis regionais. “O projeto inicial abrangia todos os óleos vegetais comestíveis, permitindo ao consumidor maior liberdade de escolha. Ao focar apenas na soja, milho e babaçu, o novo texto ignora as diversas culturas regionais que produzem óleos com grande valor nutricional e impacto econômico local”, afirma Lima.
Segundo Lima, a soja tem maior destinação para a produção de biocombustíveis e exportação do que para consumo doméstico direto, tornando-se questionável sua presença exclusiva na cesta básica. “O consumidor ficará restrito a pouquíssimas opções, enquanto o Brasil é um grande produtor de diversas variedades de óleos comestíveis”, destaca o representante.
Impactos Econômicos e de Mercado
A limitação dos benefícios fiscais aos óleos de soja, milho e babaçu pode ter impactos expressivos na economia e no mercado de óleos vegetais. Ricardo Kawabe, economista da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), alerta que a medida pode elevar os preços dos óleos vegetais e, consequentemente, afetar toda a cadeia alimentícia. “Óleos como o de algodão, amplamente utilizado na indústria alimentícia e produzido localmente, terão seu custo elevado, o que pode impactar o preço de diversos alimentos que utilizam esse ingrediente”, explica Kawabe.
Além disso, o economista prevê que a medida possa gerar um efeito cascata, levando ao aumento de demanda sobre o óleo de soja devido à diferença de preço, o que também afetaria o setor de biocombustíveis, que utiliza a soja como uma de suas matérias-primas principais.
Proposta de Emendas e Questionamentos sobre Justificativa Tributária
Frente a essa situação, três emendas foram apresentadas no Senado pelos senadores Luis Carlos Heinze (PP/RS), Mecias de Jesus (Republicanos/RR) e Zequinha Marinho (Podemos/PA) solicitando a inclusão de todos os óleos vegetais comestíveis no regime fiscal da cesta básica. A inclusão na alíquota zero, argumentam os senadores, seria uma maneira de promover uma política tributária mais justa e menos restritiva ao consumidor final, permitindo acesso a uma gama mais ampla de produtos.
A tributarista Rosany Nunes de Mello, especialista em tributação no agronegócio, vê a decisão da Câmara como controversa. Segundo ela, a medida destoa da intenção original da reforma tributária, que é garantir uma política fiscal favorável aos alimentos que compõem a Cesta Básica Nacional e promover acesso a alimentos saudáveis e diversos. “A soja já é um dos produtos mais beneficiados por isenções fiscais devido ao incentivo à produção de biocombustíveis. Colocá-la em posição privilegiada sobre outros óleos comestíveis cria uma distorção que beneficia desproporcionalmente um único setor”, analisa.
Privilégios Fiscais da Soja
Um estudo realizado em outubro de 2023 por várias entidades, incluindo a ACT Promoção da Saúde e o Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), aponta que a cadeia produtiva da soja já conta com renúncias fiscais expressivas. Em 2022, a produção de soja no Brasil obteve renúncias fiscais de cerca de R$57 bilhões em nível federal, montante equivalente ao dobro da renúncia prevista para todos os produtos da cesta básica. Em nível estadual, apenas em Mato Grosso, as desonerações de ICMS para a soja chegam a R$8 bilhões anuais, evidenciando uma concentração de incentivos tributários no setor.
O relatório do estudo questiona se essa política de incentivos, que historicamente favorece a soja em detrimento de outras culturas, ainda se justifica à luz das necessidades atuais da sociedade brasileira. Segundo o estudo, a manutenção dessa estrutura tributária gera uma concentração de renda e contribui para impactos ambientais significativos, além de restringir as opções alimentares do consumidor.
Para os autores do levantamento, a reforma tributária poderia ser uma oportunidade de rever as prioridades do Estado brasileiro, considerando alternativas mais diversas e sustentáveis que incentivem o consumo de alimentos saudáveis e adequados à segurança alimentar da população. A inclusão de uma variedade mais ampla de óleos comestíveis na cesta básica seria um passo relevante nessa direção, ampliando o acesso a alimentos que respeitem as características culturais e regionais de consumo no Brasil.
A pressão sobre o Senado agora vem de diversos setores e entidades do agronegócio, da indústria alimentícia e de organizações de defesa do consumidor, todos unidos pelo objetivo de ampliar a lista de produtos beneficiados pela alíquota zero.
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