Destinação de terras rurais: o impacto para o setor agropecuário
Imóveis rurais penhorados por dívidas tributárias podem ser destinados à reforma agrária, fomentando discussões no setor agropecuário.
Uma portaria interministerial publicada recentemente autoriza a destinação de imóveis rurais penhorados para programas de reforma agrária. Segundo Luciano Faria, advogado especialista em direito tributário no agronegócio, a medida representa uma inovação nas políticas públicas voltadas ao campo, mas levanta questionamentos sobre sua implementação e os impactos para produtores rurais.
De acordo com Faria, o processo ocorre no contexto de ações de execução fiscal contra grandes devedores da União. "Os imóveis penhorados, que normalmente iriam a leilão, agora podem ser adjudicados para programas de reforma agrária. Isso atende, prioritariamente, agricultores familiares, comunidades quilombolas e tradicionais", explicou o advogado.
O que muda na prática
A portaria permite que órgãos como a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional identifiquem e disponibilizem terras para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A partir disso, é possível a avaliação técnica das propriedades, com vistas à criação de assentamentos.
Esse modelo, porém, gera dúvidas quanto à avaliação dos imóveis. “Há um risco de que a União avalie os bens penhorados abaixo do valor de mercado, o que pode causar litígios entre proprietários e o governo", destacou Faria.
Outro ponto levantado foi a forma de compensação ao devedor. "Quando há diferença entre o valor da dívida e o valor do imóvel, a devolução ao proprietário é feita em Títulos da Dívida Agrária, e não em moeda corrente, o que pode criar dificuldades adicionais", acrescentou.
Conflitos e impactos no setor
Para Faria, a medida pode intensificar conflitos no campo. “A ideia de que essa política vai pacificar o campo é otimista demais. A desapropriação ou a retirada de propriedades costuma gerar resistência e polêmica entre produtores", avaliou. Ele mencionou ainda que a política reforça a divisão entre grandes produtores e agricultores familiares, setores que já convivem com tensões históricas.
Outro aspecto discutido é a possível recuperação de créditos pela União. "Essa portaria pode funcionar como um incentivo para que devedores regularizem suas dívidas, evitando a perda de patrimônio. Isso é positivo para os cofres públicos, mas não elimina os desafios de execução", pontuou.
Questões jurídicas e desafios futuros
Luciano Faria também destacou os recursos jurídicos disponíveis aos produtores. "É possível recorrer, negociar dívidas ou buscar descontos significativos por meio de transações tributárias. No entanto, é importante agir rapidamente para evitar a progressão do processo", aconselhou.
Sobre o futuro da medida, Faria ressaltou que sua implementação prática dependerá de estudos técnicos, avaliações de imóveis e decisões judiciais. "Ainda há muitas incertezas, especialmente quanto à eficácia do modelo e seu impacto no setor agropecuário", concluiu.
A destinação de imóveis rurais para reforma agrária reacende debates históricos sobre o uso da terra no Brasil, envolvendo interesses econômicos, sociais e políticos. A polêmica promete se intensificar à medida que a política avance em diferentes regiões do país.
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